Revista Ações Legais - page 77

ARTIGO
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do inconstitucionais as normas consideradas. Chamou a atenção especialmente os
votos dos ministros Gilmar Mendes, Luis Roberto Barroso e Luiz Fux.
O ministro Gilmar Mendes, focando nas supostas consequências danosas à atividade
desempenhada pelas citadas entidades, as quais, nas suas palavras, estariam inviabili-
zadas com a extinção de sua principal fonte de custeio, bem como na necessidade de
fomento daquelas pela administração direta, ou seja, nova despesa a cargo do governo
federal, inaugurou debate centrado em uma vertente consequencialista da atuação da-
quele tribunal constitucional.
Há uma fragilidade nessa argumentação, ainda que caiba uma ponderação nesse aspec-
to. Como consequência possível de uma declaração de constitucionalidade ou inconsti-
tucionalidade de uma norma, sempre alguém "sairá perdendo". E, no caso, perdem os
contribuintes, pessoas jurídicas que continuarão arcando com uma contribuição possi-
velmente ou efetivamente inconstitucional, que anualmente representa até 75% de um
mês de sua folha de salários. O papel da Suprema de Corte, de zelar pelo cumprimento
da Constituição Federal, pode ser substituído pela decisão a respeito de tais perdas e
tais ganhos?
Em relação ao posicionamento dos ministros Luis Roberto Barroso e Luiz Fux, basi-
camente, ainda que entendam pela inconstitucionalidade da norma então em exame,
considerando o "momento" que estamos passando, com uma citada "justificativa me-
tajurídica", arvoraram-se na tese proposta pela divergência, o que causa especial preo-
cupação.
Vale dizer, em um tribunal constitucional, em que os ministros são nomeados conforme
requisitos de reputação ilibada e notório saber jurídico e que tem como pressuposto de
existência a defesa da própria Constituição, essa tarefa foi negada de modo a acomo-
dar interesse imediato da administração de turno, em vista da situação excepcional em
que vivemos.
O mais interessante é que, ainda que passível de crítica pela incoerência do instituto
conforme utilizado no Brasil, esses argumentos poderiam facilmente ser acomodados
em um provimento do pedido de modulação de efeitos no tempo por parte da procu-
radoria federal, talvez até com um marco temporal "exótico", por exemplo, declaração
de inconstitucionalidade daqueles normativos com efeitos a partir de janeiro de 2021,
ou mesmo 2022.
Afinal, a situação excepcional é evidente e, como não poderia deixar de ser, causa apre-
ensão. Visando combater os efeitos da pandemia do novo coronavírus na economia, o
governo federal "abriu o cofre", o que deve projetar o endividamento público de 71%
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