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Ócio Criativo
Para De Masi, quase 70% da sociedade pós-industrial é composta por trabalhadores inte-
lectuais. Desses, parte se destina a funções executivas (telemarketing, recepcionistas,
bancários, entre outros) e outros a atividades criativas (artistas, jornalistas, publicitários,
profssionais liberais, cientistas, etc.). “Se o trabalho for repetitivo, cansativo, chato, de
subordinação, reduz-se a uma escravidão, a uma tortura, a um castigo bíblico. Nesse caso,
a única defesa consiste em trabalhar omenos possível, pelomenor número de anos possí-
vel. Mas se, em vez disso, for uma atividade intelectual e criativa, então ocupa toda nossa
inteligência e satisfaz nossas necessidades de autorrealização. Nesse caso, confunde-se
o trabalho com o estudo e com o lazer, transformando o trabalho em ócio criativo”, diz.
Segundo o sociólogo, na vida pós-industrial, organizada para produzir principalmente
ideias, não existe trabalho e não existe horário. Existe apenas o ócio criativo, que dura
24 horas. “Mesmo quando se dorme, se produz ideias, sonhando”, refete. Para De Masi,
o grande paradoxo é que as tecnologias da informação possibilitam o teletrabalho, mas
todos continuam a trabalhar nas empresas. “A produção de ideias precisa de autonomia
e de liberdade, mas as empresas tornam-se cada vez mais burocráticas. As distâncias cul-
turais entre os chefes e os funcionários diminuem, mas as das faixas salariais aumentam.
As empresas pregam colaboração, mas estimulam competitividade. A oferta de trabalho
diminui e a procura por trabalho cresce, mas as empresas não reduzem a carga horária.
Poderíamos trabalhar todos e pouco, mas alguns trabalham dez horas por dia enquanto
seus flhos estão desempregados”, afrma.
Para o professor italiano, as Leis Trabalhistas brasileiras foram feitas para os empreende-
dores e para os sindicatos. “Eles têm mentalidade industrial, não pós-industrial. Eles têm
medo da organização pós-industrial, porque a confundem com a anarquia”, diz. “Quando
se produz parafusos, um minuto é importante. Mas quando se produz uma ideia, um mi-
nuto não signifca nada, porque em um minuto eu posso ter uma grande ideia, e em um
dia eu posso não ter ideia nenhuma”, explica. “A produção das ideias não se adéqua à
produção material. Aplicar a organização material à organização das ideias é loucura, cria
infelicidade”, acrescenta.
Vida Satisfatória
No encontro, De Masi divulgou as ideias que traz em seu novo livro, que deve ser lançada
em breve na Itália, Estados Unidos e Brasil. A obra surgiu da observação do sociólogo em
relação aos modelos de vida atuais e estudos comparativos sobre a herança de diferentes
modelos de vida no mundo - cristão, muçulmano, greco-romano, renascentista, iluminis-
ta, capitalista, japonês, chinês, indiano, brasileiro, etc. “Os modelos de vida existentes
hoje, em todas as partes do mundo, não são satisfatórios. As nações mais ricas são as que
produzem mais infelicidade”, afrma.
Segundo De Masi, o modelo capitalista está longe de ser o ideal. Se o consumo, por um
lado, signifca bem-estar, por outro, se traduz em escravidão. O sociólogo descreve clara-
mente dois tipos de necessidades humanas: as quantitativas, criadas com o capitalismo
(riqueza, dinheiro, poder e posses), e as qualitativas (introspecção, amizade, diversão,
amor, beleza, convívio, etc.). Para De Masi, a satisfação das necessidades quantitativas
impede a satisfação das qualitativas. “Quem tem muita necessidade de riqueza, trabalha
longas jornadas. Tem que trabalhar muitas horas por dia, e deixa para trás o amor, a ami-
zade, o convívio familiar”, explica.
A nova obra do pai do ócio criativo discorre sobre como criar um modelo de vida que
traga felicidade aqui e agora. Diante desse problema, De Masi chegou ao modelo brasi-
leiro - que é com o qual o livro termina. “Não é o modelo ideal, mas tem muita coisa para
ensinar ao mundo”, afrma De Masi, admirador de Oscar Niemeyer e das obras de Darcy
Ribeiro que, segundo o sociólogo italiano, é um dos únicos que descreve o Brasil antes
de 1500 e a perfeição do modo de vida dos índios que aqui viviam. Para ele, a riqueza do
modo de vida brasileiro está na diversidade cultural, miscigenação de raças e etnias, a
convivência em paz com todas as demais nações e o governo democrático.
Palestra reuniu professores e estudantes no auditório da UniBrasil